Todos nós já tivemos noites em que lutamos para dormir, mas imagine estar preso em um ciclo de insônia que fica progressivamente pior até que você não consiga obter um único segundo de sono – e então, você morre.
Foi exatamente o que aconteceu com Silvano, um italiano descrito como tendo cabelo ruivo e um impecável senso de vestimenta. Em 1984, Silvano estava de férias a bordo de um navio de cruzeiro quando percebeu uma estranha variedade de sintomas, começando com um caso grave de suores e contração de suas pupilas.
A doença piorou. Ele não conseguia dormir, desenvolveu tremores e morreu em poucos meses.
Isso chama-se insônia familiar fatal (IFF). Uma condição extremamente rara e extremamente angustiante que é, em quase todos os casos, fruto de um gene defeituoso.
Houveram apenas 24 casos relatados do que é chamado de IFF esporádica, que é quando o portador da condição não tem histórico familiar da doença.
Jornalista DT Max descreve o início da IFF em seu livro de 2006:
The Family That Couldn´t Sleep:
Normalmente, um dia na meia idade, o sofredor descobre que ele começou a suar. Um olhar no espelho mostrará que suas pupilas se encolheram e ele está segurando a cabeça de um jeito estranho e rígido … A constipação é comum, as mulheres de repente entram na menopausa e os homens ficam impotentes. O sofredor começa a ter problemas para dormir e tenta compensar com um cochilo à tarde, mas agora vale a pena. Sua pressão arterial e pulso se tornaram elevados e seu corpo está em overdrive. Nos meses seguintes, ele tenta desesperadamente dormir, às vezes fechando os olhos, mas nunca consegue cair em mais do que um leve estupor.
Pode haver outros sinais como ataques de pânico, perda de peso, fobias e perda de apetite. A condição progride rapidamente e o indivíduo pode começar a sentir alucinações, delírio e movimentos descoordenados ou contorções. O que começa como névoa cerebral se transforma em confusão e, finalmente, em dificuldade de andar e falar.
Além do mais, é letal. O portador geralmente morre dentro de 12 a 18 meses após perceber os primeiros sintomas.
Na história de Silvano, a mutação genética pode ser rastreada até um médico que vive na Veneza do final do século XVIII. O sobrinho do médico, um aristocrata italiano chamado Giuseppe, também adoeceu. Então, seus filhos, Angelo e Vincenzo, e assim por diante, desceram a linhagem até chegar a Silvano na década de 1980.
Há pelo menos 28 famílias em todo o mundo infligidas com esse gene. A maioria, como a de Silvano, tem uma história trágica envolvendo “uma doença desconhecida mas mortal” que atinge pessoas na meia-idade.
Muito do que hoje sabemos sobre a Insônia familiar fatal é graças ao próprio Silvano, que marcou uma consulta com cientistas da Universidade de Bolonha, na Itália, a pedido de sua filha depois do início dos sintomas. Desde então, a universidade concluiu testes genéticos e estudos sobre vários membros da família. No entanto, cada um optou por não saber se possui ou não o gene.
A explicação científica da insônia familiar fatal:
Pesquisadores em Bolonha descobriram que a condição é o resultado de uma proteína cerebral deformada chamada Príon, muito semelhante à doença de Creutzfeldt-Jakob e à encefalopatia espongiforme bovina (mais conhecida como doença da vaca louca).
O príon associado a IFF afeta uma área do cérebro chamada tálamo, responsável pelo gerenciamento do ciclo vigília-sono e está envolvida em outras atividades cerebrais importantes, como equilíbrio, memória, fala, personalidade, emoções e comunicação.
A mutação faz com que os neurônios do tálamo se rompam e é essa falta de neurônios que desencadeia os sintomas da Insônia familiar fatal.
É também o que impede o portador de dormir. Em uma pessoa saudável, a pressão arterial cai logo antes de adormecer, mas em pessoas com essa condição isso não acontece. Em vez disso, o corpo permanece em alerta máximo e é incapaz de alcançar o sono profundo e restaurador.
A maioria das pessoas com o gene defeituoso começará a apresentar sintomas entre os 32 e 62 anos, mas tem havido incidentes que acontecem a partir dos 12 anos e aos 84 anos. É uma mutação genética dominante, isso significa que uma criança cujo pai tem a condição tem uma chance de 50 por cento de desenvolvê-la.
Existe cura para a insônia familiar fatal?
Infelizmente, não existe, mas existem vários tratamentos e métodos que podem atrasar os sintomas.
Um paciente, conhecido apenas como Daniel, foi capaz de adiar os sintomas mais graves e morte com uma série de técnicas, incluindo um tanque de privação sensorial que lhe permitiu dormir por horas.
Combinados, os tratamentos foram tão eficazes para aliviar seus sintomas que Daniel foi capaz de passar seus últimos anos escrevendo um livro e viajando pelos EUA em um motorhome.
Há também o caso de Sonia Vallabh, que perdeu a mãe para a condição em 2010. Ela descobriu que também compartilha o gene. Vallabh e seu marido, Eric Minikel, desistiram de seus empregos, tornaram-se cientistas e iniciaram um doutorado na Harvard Medical School.
Eles agora estudam doenças priônicas no Laboratório Schreiber do Instituto Board, onde seu objetivo é encontrar uma cura antes que Vallabh comece a desenvolver os sintomas. Eles mantêm atualizações regulares sobre seu progresso em prionalliance.org.
O casal continua otimista.